*Cláudia Helena Villela de Andrade
“É o chicote do corpo”, dizem alguns. “Cuidado para não morder a língua”, dizem outros. “A língua de fulano é como língua de cobra “. “Beijo de língua é bom”, todos dizem.”Lambida na virilha “ é maravilhoso, dizem outros.
Tanto pode matar como fazer gozar. Pode ser boa. Pode ser má.
A língua articula palavras. Pode emudecer. Pode mostrar. Pode cuspir. Pode assobiar. Pode engolir. Pode degustar. A língua pode fingir...enganar.
É maldita e bendita. Feia e bonita.
Estava ela sorrateira, deitada na areia de Ipanema, debaixo de um sol escaldante ao lado de uma língua negra de esgoto , na véspera, a chuva tropical havia lavado a cidade. O próprio vento fazia uma língua de água salgada a despejar à beira-mar sua ressaca. Aquela língua ia e vinha. Olhando de lado via-se, perfeitamente, o mar colocá-la para fora e guardá-la a todo instante. A boca do mar abria e a língua saia espumante, borbulhante e bonita. Atingia até uma determinada faixa da areia e voltava para dentro da boca cheia. O mar bochechava e cuspia de novo. Por raros momentos, ele gargarejava. Recolhia, sacudia, reunia e formava ondas gigantes. Imediatamente, cuspia tudo na praia.
A língua, lá estava, deitada torrando no sol de verão. Pernas meio abertas para o sol. Joelhos para cima. Corpo moreno e dentes brancos. A língua se comprimia na areia e se debatia como uma perereca que pula. Lembrava um chicote e estalava no solo como a sacudir os grãos do corpo. Como a falar mal dos outros. Batia. Batia. Batia. Os dentes ficavam doídos de tanta falação. A garganta ardia. O mar ouvia, via e engolia.
A pele áspera, pegajosa do órgão oblongo, achatado e musculoso. A saliva grossa, venenosa. Falava e falava no ouvido do oceano uma língua morta, extinta, que ninguém mais entendia. Ele engolia mas, repelia e cuspia o sal na língua viperina que insossa vomitava o que de bom o mar respondia numa língua viva, atual, moderna, respeitada, consertada, bem renovada.
O sol estava quente demais. Desses dias que o termômetro marca 40 graus na sombra. E a língua não desistia e insistia em rebater a cavidade bucal do grande oceano. Ele, nem um pouco pacífico respondia em linguagem atlântica. Morto que estava. Negro de chuva. Índico e mediterrâneo como os antigos povos. Do sul ou do norte, isso não importava. Por vezes, achava que estava sendo confundido com o Nilo. Não era. Nem tão pouco o Amazonas. Era ele, o ocupante principal do planeta. O dono de inúmeras verdades e segredos. Quem pensava ser aquela língua da boca maldita?
Era apenas mais uma língua que esbravejava coisas sem sentido. Quantas não existem por ai que falam e falam e a gente escuta ou finge que escuta. Que entra por um ouvido e sai pelo outro. Portanto se a língua finge, fingimos também e tudo fica assim. Morta , viva, boa ou má.
O mar sabe, que “brigam Espanha e Holanda pelos direitos do mar , o mar é das gaivotas que nele sabem voar, brigam Espanha e Holanda pelos direitos do mar, porque não sabem que o mar é de quem o sabe amar”.
O mar sabe falar todas as línguas pois passa em muitos lugares. O mar passa a língua na areia, aceita, engole e devolve.
O mar é a língua do cosmo ou de Deus. A língua é um complexo. É um órgão imprescindível da humanidade.
A língua só é boa quando cala ou quando é do mar, que faz, faz, faz, faz.....gozar.
*Claudia Helena Villela de Andrade,carioca, professora, escritora, terapeuta holistica.
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